segunda-feira, 4 de maio de 2020

Feliz foi 2019...

Se eu tivesse escrito esse texto alguns meses atrás teria começado com Feliz 2020, era um ano que me parecia tão promissor, a começar pelo design dos números 20 e 20 em sequência. Passado alguns meses descobrimos que ele seria marcante, traria muitas rupturas, mas ao mesmo tempo dor e sacrifícios, isso porque fomos assolados por uma pandemia. 
Essa trouxe para o mundo um conjunto de sentimentos, inconstâncias entre outras sensações, estamos presos em nossas casas, em quarentena. Alguns há mais de um mês (me incluo nesse alguns) e outros estão trabalhando por aqueles que podem ficar em casa (inclusive gratidão há esses) e tem uma minoria também que foi enfeitiçada pela ignorância de um dos nossos governantes, infelizmente.
Já escrevi muito no meu diário sobre esse momento triste que o planeta está vivendo (inclusive resgatei meu rascunhos em papel e caneta há um tempo), revirei as entranhas, pari dores e ativei reflexões que estavam adormecidas nas profundezas do meu eu.
Engraçado que boa parte da minha vida, prezava pelo eco-centrismo, pela coletividade, pelo amor aos outros e a natureza, por uma sociedade mais justa e sustentável, enquanto eu estava ali lutando pela utopia que eu acreditava, tinha uma maré de pessoas remando no movimento contrário, no egocentrismo... Vivendo a loucura do capitalismo (na qual eu também participo, vide meu modo de vida agitado vivenciado nos últimos anos), na competição, no consumo desenfreado, na desconexão com a natureza. 
Ao viver nessa sociedade e tentando de alguma forma lutar para transformá-la me deixei adoecer, e adoecer metaforicamente, não fiquei doente física ou mentalmente, mas me sentia cansada, desgastada e sem forças para continuar, mesmo intuitivamente sabendo que precisava tomar folego, continuei, continuei firme, sem ceder. Eis que em final de 2018 eu morri, desmoronei por dentro, meu interior se desfaleceu, durante todo 2019 passei de alguma forma tentando me reerguer, em um processo que denominei de cura, e esse texto é sobre isso, é sobre 2019, sobre mim e não sobre os outros. 
Agora que estamos em meio há uma pandemia tive muito tempo para pensar, e comecei a refletir o quanto o ano que se passou foi importante para mim. Comecei  recusando 2 faculdades, essas que eu queria muito entrar e que tinha prestado vestibular com a intenção de cursá-las, mas entendi que se eu ingressasse em outra graduação não romperia o ciclo que vivia há anos; em seguida eu me formei em psicologia, um curso que durante 5 anos me trouxe milhares de sensações que variavam da euforia ao completo desespero. Resolvi continuar trabalhando em um lugar que tinha me acolhido também no ano anterior e que me causava múltiplos sentimentos, mas na maior parte positivos, afinal eu estava com pessoas maravilhosas ao meu redor e estar solitária nunca foi meu forte, esse lugar me deu confiança sobre quem eu era e sobre quem gostaria de ser e fazer. 
2019 também foi ano de viajar, e viajei muitas vezes. Já diziam que as viagens curam a alma...Foram momentos que me fizeram lidar com a minha própria companhia e com tudo que se instaurava dentro de mim. Duas dessas foram internacionais, carimbei meu passaporte com um selo do Equador e um do Peru, duas aventuras nas quais venci vários medos e minhas próprias limitações. Também conheci Itajubá em uma loucura bate e volta de 16 horas de ônibus, senti 3 vezes a brisa do mar em Ubatuba e revisitei São Paulo por mais duas vezes (e minha relação de amor e ódio por lá continuou intensa). 
Esse também foi o ano das oportunidades profissionais, compartilhei meu conhecimento em diferentes palestras para diferentes públicos, foi palestra sobre "Gestão de Pessoas no Terceiro Setor", "Processo seletivo para alunos de graduação", "Como elaborar projetos de carreira para empreendedores"; "Como prospectar comunidades e motivá-las",  entre outros temas, fiquei feliz em perceber que os conhecimentos que adquiri de alguma forma serviram para outras pessoas.
No meio do ano passei no mestrado, foram dias de incerteza , estudo e indecisão sobre o projeto que eu queria escrever, também no mesmo período conduzi vários projetos em educação no meu trabalho que me orgulho demais, conduzir uma área praticamente sozinha foi um aprendizado e tanto.
Por último, mas não menos importante fechei feridas que assolavam meu coração e me dei a oportunidade de viver uma nova história. 
Mas o mais importante desse ano, é que ele me permitiu amadurecer e descobrir que está tudo bem em não ter controle de todas as coisas. É possível viver fazendo menos, 2019 me preparou para desacelerar, me ensinou que isso era necessário, depois dele eu estava pronta para parar, respirar e dar espaço para o meu eu interior se recuperar. Esse "eu interior", inclusive parou de gritar por calma, porque estava decidida a dar a ele o que merecia,  respeito. Estava disposta a entrar em uma viagem individual que envolvia parar, adotar o egocentrismo de olhar para mim e para mais ninguém por um período, que preferi não determinar. 
2020 chegava e prometia poucos planos, porque eu queria ficar quieitinha e pela primeira vez em muitos anos eu estava disposta a cumprir minha promessa, e isso se devia ao fato de ter me preparado longamente para isso. 
Até que imprevisivelmente o mundo fez não só a Bianca desacelerar, mas também a maioria dos humanos que  habitam a terra, enquanto eu tentava de alguma forma adotar o egocentrismo para sobreviver, o planeta e uma pandemia se encarregaram de apresentar o eco-centrismo para a humanidade, o eco-centrismo e os seus princípios passou a estar presente no discursos de muitas pessoas que antes mal haviam parado para ouvir sobre ele. Não quero romantizar, longe disso, toda essa situação não é nem um pouco bonita e eu daria tudo para ela não estar acontecendo agora. 
Mas em um pensamento muito auto-centrado inclusive, não consigo deixar de pensar de uma forma mística sobre o fato das minhas entranhas saberem que eu ia ser obrigada a parar e que ela de alguma forma me preparou. Desacelerar em 2020 iria acontecer por bem ou por mal, o que não sabia era que a pausa não seria só comigo, mas com o mundo inteiro... Diante de todo esse colapso que sorte a minha ter ouvido as profundezas do meu eu e ter tentado passar 2019 me planejando para me isolar. 
Espero que minha cura termine junto com a pandemia, por que o planeta vai precisar de uma multidão para reerguê-lo e espero profundamente poder fazer parte disso, atualmente uma grande parte minha está fechada para balanço e estou tentando respeitá-la, enquanto uma outra está se contorcendo para não arregaçar as mangas já agora para fazer algo, uma vez que eu sei que esse momento exige muita mobilização e ação coordenada, porque os mais pobres sempre sofrem mais, inclusive durante uma pandemia. 
Feliz foi 2019 e espero que possa haver esperança em 2020 e que seu processo junguiano de individuação seja promissor, não só o seu, mas o do mundo!

*Escrito em começo de abril de 2020 em um dos dias de isolamento que eu já não me lembro qual.

quarta-feira, 13 de fevereiro de 2019

Estou esperando o seu lencinho...

Eu estou chorando de novo... Fazia anos que eu não tinha uma recaída assim... Minha vida tinha voltado ao normal, eu estava bem e quase não lembrava de você... Conheci pessoas novas, fiz amigos novos e a maior parte das pessoas que convivem comigo atualmente não sabe que você existiu e de repente eu senti um aperto no peito por perceber que pessoas importantes para mim não sabem da nossa história, eu escondo uma parte de mim que foi tão importante, no caso você... Minha mãe está preocupada comigo, acho que ela não me vê assim desde que você se foi, ouvi ela ligando para sua mãe quarta-feira passada (Falando em quarta-feira, elas são amaldiçoadas são os dias mais difíceis), mas voltando a falar sobre o telefonema, elas choraram, sei disso porque minha mãe estava tentando consolar a sua daqui, mas era óbvio que ela não conseguiu porque ela também estava chorando. Ouvi minha mãe falando que eu sinto sua falta e que eu chorei praticamente novembro inteiro escondida (Ela tem razão, chorei no banho para ninguém ouvir, no ponto de ônibus e em tantos outros lugares que perdi a conta), ela acha que tem alguma coisa a ver com o fato de eu ter viajado sozinha bem na época do aniversário da sua morte, eu falei mil vezes que foi uma coincidência, mas ela não acredita em mim. Eu queria que você tivesse comigo as vezes sabe? Queria que tivesse comigo no dia que eu vi um dos por do sol mais bonito da minha vida e que tivesse lá para me fazer companhia... Queria que meus amigos atuais pudessem ter te conhecido e que eu pudesse falar sobre você sem sofrer. 
Esses dias eu entendi porque ando sentindo sua falta bem agora depois de tanto tempo... É justamente porque chegou a hora de eu seguir em frente, ano passado eu comecei a sentir a mesma coisa que sentia por você mas por outro alguém e foi a primeira vez sabe? (Achei que isso nunca mais aconteceria) Fiz umas análises e percebi que os últimos caras que eu fiquei foram embora de alguma forma, fiquei pensando se escolhi propositalmente ficar com caras que iam embora para repetir o luto que vivi ou se simplesmente queria me proteger de viver um relacionamento que fosse duradouro porque daí não existiria mais espaço para nossa história.
Eu não sei qual é a resposta, mas estou vivendo o momento mais triste e mais feliz da minha vida. De uma hora para outra me arrependi de não contar para os outros sobre nós! Queria contar para todo mundo que me conheceu depois da sua morte, o quanto eu fui a menina  mais sortuda e amada quando estávamos juntos! Queria que soubessem que um dia eu te amei! Que depois de você também gostei de mais dois caras que sumiram da minha vida igual você, mas que quando eu tenho vontade posso visitar as redes sociais deles e as vezes rola até uma curtida nas minhas fotos de instagram. 
Eu continuo chorando, mas dessa vez meu choro tem motivo, fui fazer um limpa no meu guarda-roupa e achei um moletom seu, um daqueles que você esqueceu aqui, uma das poucas coisas que eram suas e que ficaram para mim... O meu irmão entrou bem na hora no quarto e me viu olhando para o moletom, comentou algo sobre você usar ele só no inverno e que a gente está no verão, pegou a roupa das minhas mãos e enfiou no fundo da minha gaveta de novo, em seguida me falou que estava na hora de eu roubar uns moletons do Cadu. Voltei a chorar de novo, porque se você tivesse aqui me falaria que chorar faz bem e em silêncio buscaria um lencinho para mim. Estou esperando esse lencinho tá?


* Escrito em 23/01/2017


quarta-feira, 16 de janeiro de 2019

As bolhas de sabão estouraram antes de 2019

2019 chegou como um trator, passando por cima de tudo e sem ao menos me dar tempo de assimilar 2018... Ainda não sei se isso é um bom sinal ou não. Se por um lado me ajudou a dar adeus a 2018, um ano interminável que me fez um mal enorme, tenho medo dele ter chego em um momento importuno não me dando espaço de assimilar o que aconteceu em 2018, e quando não refletimos sobre nossos erros e sentimentos damos margem para repeti-los, e tudo que não preciso é sofrer novamente. 
Falar de 2018 é muito difícil, ele foi intenso, isso não posso negar... Foi tudo tão insano, que não sei direito nem por onde começar. Como tudo na vida ele foi feito de momentos bons e ruins e ainda preciso assimilá-los para entender se os ganhos foram maiores que as perdas. Tiveram tantas coisas maravilhosas principalmente no primeiro semestre, terminei minha gestão na Enactus com muito sucesso, impacto, amizades e resultados; escrevi um capítulo de livro que foi publicado; comecei três estágios incríveis; aprendi milhares de coisas novas; me aproximei ainda mais da administração uma área do conhecimento que sempre tive vontade de entender melhor; conheci pessoas especiais tanto na vida pessoal como na vida profissional que me ensinaram muito; viajei para Fortaleza com amigos para o Encontro Nacional da Enactus Brasil, voltei para Jericoacoara lugar que tenho um carinho enorme,  continue participando de projetos sociais dos quais me orgulho muito, prestei vestibular de novo, me apaixonei. Mas 2018 também foi um ano de finalizações, de finalizar ciclos para iniciar outros, e no meio do caminho me vi me despedindo das coisas e das pessoas que mais me faziam felizes, me vi me despedindo de mim mesma e isso me custou um preço altíssimo do qual ainda estou pagando.  
Realizações, sucesso e conquistas exigem abdicações e sacrifícios, eu sempre soube disso, mas ainda não sei ao certo se abdiquei das coisas certas em prol do que conquistei, e pensar nisso me angustia muito e me dá vontade de chorar, acredito que o tempo me dirá se fiz as escolhas certas e se não fiz de qualquer forma eu terei aprendido.
Mas por que foi tão ruim? Foi ruim porque não me permiti me amar, me cuidar, respirar, valorizar o que estava construindo e comemorar minhas conquistas... Lembro de um determinado momento do ano colocar a cabeça no travesseiro e perguntar-me o que eu estava fazendo da minha vida, eu me doei para muita gente esse ano, mas me respeitei pouco, esqueci que meu tempo é valioso e que não adianta construir sem poder usufruir. Fiz rotinas intensas de trabalho e parei de me dedicar ao que gostava. Me despedi de forma abrupta de tudo que representava minha história, deixei a Enactus, o Roda de Saia, me despedi da Extensão em Bonfim, do PEIC, eu sabia que isso iria acontecer em algum momento, mas não sabia o impacto que isso teria na minha rotina. Além dos projetos, me afastei dos meus amigos sem perceber, me distanciei das pessoas que mais amava e nem percebi o que foi mais cruel ainda. Minha família também não estava em sua melhor fase e eu não pude dar a atenção da qual ela merecia, lembro de estar só de corpo presente nos cafés da minha avó e de um dia não comparecer em um porque estava tão exausta fisicamente e mentalmente que dormi (me senti péssima por isso). 
As vezes me pergunto se estou com uma percepção distorcida da realidade, odeio assumir para mim mesma que meu ano foi ruim, afinal 2016 e 2017 foram tão incríveis e nos últimos 3 anos venho reclamando que tenho pouco tempo, sempre fiz milhares de atividades simultaneamente, as pessoas me perguntavam como eu conseguia me dedicar a tantas coisas e fazê-las tão bem e eu nunca sabia explicar, só sabia que antes me sentia realizada e completa, mas não sei o que aconteceu que mudou meu estado de satisfação de 2016 e 2017 para angustia em 2018, afinal meu ritmo de vida continuava quase o mesmo e eu conquistei milhares de coisas. Qual foi então a diferença? Tenho algumas hipóteses, pode ter sido o cansaço acumulado dos outros anos, a pressão de ter que lidar com o fim da graduação e me deparar com o futuro (finalizações nunca são fáceis para mim), as eleições presidenciais, um coração partido devido um quase relacionamento conturbado para caralho ou o mais provável a junção de todas as opções anteriores. 
Dezembro fiquei extremamente introspectiva, analisando tudo que aconteceu, me dando conta de todas as coisas que ganhei e perdi. Lembrei que vivi momentos inesquecíveis no Ministério Público e no Assentamento com o projeto das fossas sustentáveis, que criei laços inexplicáveis e aprendi infinitamente no Supera e no Projete, que conheci pessoas maravilhosas, fortaleci algumas poucas amizades, criei oportunidades para minha trajetória profissional, amadureci, cresci muito no âmbito profissional e amoroso também. 
O saldo parece equilibrado, mas não me sinto satisfeita, estou me recuperando ainda, estou me curando de um coração despedaçado devido uma história que me colocou no buraco, de não poder estar com a minha família como gostaria, de por falta de tempo não conseguir estar com meus amigos que se despediram de mim com o fim da graduação, por não conseguir dizer "NÃO" para os outros e me colocar em primeiro lugar.
Estou aprendendo e isso é o suficiente para me manter em pé, eu que sempre fui resistente a abrir mão dos meus valores, me vi perdida deles. Faz três anos que venho prometendo desacelerar, olhar para mim, faz três anos que venho negando isso para mim mesma. Achei que 2019 ia ser diferente, mas me vejo atolada de coisas e ainda é janeiro, me sinto exausta, perturbada e com muito medo de repetir tudo de novo, mas uma tal de intuição insiste em me mostrar que esse não é o caminho. Não é atoa que ela me fez escrever esse texto. Seguimos firmes no propósito autocuidado para 2019. 

sábado, 31 de março de 2018

Meu Rio...Nosso Rio?

Hoje fiquei pensando sobre o Rio de Janeiro. Acho trágica a contradição da cidade maravilhosa... Como beleza, violência, riqueza e pobreza se fundem como algo natural? Senti saudades de um Rio que conheci e desejei por um momento que ele fosse por completo assim... Queria que meu pensamento tivesse força suficiente para fazer as pessoas e as coisas mudarem #iludida. Enquanto isso eu só fico no desejo e nas minhas fotografias... 






domingo, 28 de janeiro de 2018

Entre ex-cunhadas

A saudade está me matando, vamos dizer que talvez eu esteja tendo outra recaída, doí muito e é lá no fundo da alma, uma dor tão profunda que chega quase ser a dor que eu senti nas primeiras semanas de luto. É um aperto que me sufoca, me sinto fraca com vontade de gritar e abraço todas as pessoas na esperança de algum desses abraços me consolar, mas nenhum substitui o seu e fico angustiada de pensar que nunca vou poder te abraçar de novo, começo a chorar. 
Semana passada fui no cemitério, eu e sua irmã, o Cadu se ofereceu para ir junto, mas preferi que fosse uma visita entre ex cunhadas. Eu não ia no cemitério desde a sua morte, não conseguia, era e ainda é sempre muito difícil ficar de frente para algo que comprove que você nunca mais vai voltar. Chegamos no túmulo em silêncio, fiquei em frente a lápide fria que estava cheia de flores, olhei para sua irmã confusa e ela me falou que eram de Cadu, de repente me dei conta que Cadu trabalha muito perto do cemitério e mais tarde descobri que ele sempre vai conversar com você, inclusive sua irmã me contou que quando tentamos ficar juntos ele ia quase todos os dias no seu túmulo pedir conselhos, ele nunca me contou isso, na hora que descobri ri, isso é tão típico de Cadu, mas agora pensando achei trágico e me deu vontade de chorar. Cadu é ótimo, mas você já sabe disso, ele está namorando agora, sabia? Me apresentou a namorada dele no meu aniversário e achei simbólico, primeiro porque a primeira vez que ele tentou ficar comigo foi na minha festa e segundo porque meu aniversário é em finados e eu, ele e todos nossos amigos sempre lembramos de você, mesmo que nos últimos anos evitamos tocar no seu nome nas minhas comemorações.
Fiquei um tempão olhando as flores, passei mais tempo ainda olhando sua foto sorridente do lado da foto do seu avô, comecei a lagrimejar, achei que ia ser mais fácil, pensei que iria desmaiar. Sua irmã e eu trocamos um longo olhar e ela me abraçou, foi um abraço forte, quase como seu abraço e talvez tenha sido por isso que eu comecei a chorar descontroladamente e só depois me dei conta que ela também chorava. 
Ficamos sentadas no seu túmulo com os rostos inchados de choro, ela ficou brincando de bem me quer e mal me quer com uma flor. Conversamos sobre a faculdade, sobre os caras que pegamos recentemente, ela me perguntou se eu ainda te amava, disse que existem amores que nem a morte separa. Me contou que achou um caderno seu de anotações e que nele tinha vários textos com meu nome, perguntou se eu queria para mim de recordação, eu disse que sim. Sua irmã sempre foi um anjo na minha vida, me pergunto como foi que deixei ela escapar, porém me dei conta que foi eu mesmo que escapei porque doía demais estar com ela e lembrar de você. 
Fomos para sua casa, descobri que seu quarto virou um escritório, mas seu violão continua intacto no mesmo lugar e parece que você vai aparecer a qualquer momento para tocar uma música. Jantei com seus pais, nos sentamos na mesa da sala de jantar, conversamos causalidades, sua mãe fez aquela torta de frango que é minha favorita e me deu mil beijos e abraços falando que sentia minha falta. Seu lugar na mesa ficou vazio o tempo inteiro e me lembrei dos jantares de domingo que a gente ficava de mãos dadas por de baixo da mesa ouvindo seu pai falar sem parar sobre o Palmeiras enquanto esperávamos a sobremesa. A verdade bateu na minha cara de uma forma arrebatadora ao perceber que diferente da sua mãe, a minha jamais vai poder fazer de novo seu macarrão com molho branco preferido para você poder comer.
Sua irmã falou do estágio, depois contou para seus pais do meu estágio também, sua mãe sorria para mim e me pediu infinitas vezes que eu voltasse, seu pai me perguntou se eu gostei da namorada do Cadu e eu disse que ela parecia bem legal, a sua mãe sussurrou algo sobre ter torcido para ele e eu termos dado certo, foi quando seu pai me perguntou se eu estava namorando... Me deu um nó na garganta, eu quis começar a chorar, mas só sorri e disse que não. Ele falou que eu precisava seguir em frente, comentei que talvez tivesse um cara na jogada, ele me perguntou se era palmeirense, eu disse que não. Pensei que ele ia ficar decepcionado, mas no fundo acho que ficou aliviado.
Lavamos a louça todos juntos como nos velhos tempos, na hora de ir embora, recebi um abraço coletivo e me arrependi muito de ter me afastado da sua família, pedi desculpas, e me senti idiota, eles sofreram tanto quanto eu, na verdade até mais, e eu fui egoísta. Mas assim como você eles sempre foram muito compreensivos. Sua mãe disse algo de ter perdido um filho e ganhado uma filha, fiquei sem reação...
Na hora de embora quando entrei no Uber comecei a chorar, mas dessa vez foi de alegria. Desde aquele dia comecei a achar que as coisas vão ficar bem, na verdade elas já estão ficando, e talvez essa não seja uma recaída, mas sim o final de uma fase que parece que está ficando bem resolvida. Sinto sua falta, mas estou entendendo que faz parte da vida, talvez esse seja o último texto que vou escrever para você.