Levantei da cama antes dele, peguei meu shorts jeans que ficou esquecido jogado em cima da minha cadeira em frente a escrivaninha e aproveitei para pegar uma camiseta limpa, abri a gaveta mas minhas roupas estavam todas sujas e acabei pegando uma blusa cinza dele que eu gostava tanto e que ficava quase que como um vestido em mim. Entrei em baixo do chuveiro, deixei a água fria cair por todo o meu corpo, minha cabeça latejava. Só conseguia pensar em que diabos que tinhma feito com que eu fizesse tudo aquilo. Não que eu estava arrependida, eu só estava pensando o quanto tinha bebido na noite passada para conseguir começar o ano daquele jeito. Me enxuguei, fiquei um bom tempo dentro do box tomando coragem para sair dali. Trocada e limpa fui para o quarto, sempre soube que ele tinha o sono pesado, mas me surpreendi por ainda não ter acordado, eu dormi mal toda espremida na minha cama pequena e me surpreendi com ele dormindo tão bem e profundamente, me senti feliz por isso. Sentei no chão perto da cama e fiquei olhando-o dormir, passaram 2 horas, meus cabelos já tinham se secado quase que completamente, estava lendo um dos livros que ele tinha me trazido na noite passada, desde que nos conhecemos a longos anos atrás sempre trocávamos livros, costumávamos conversar sobre poesia, e no natal me deu um buque de flores e um livro do Mário Quintana, não bastando isso ontem declamou para mim minha poesia preferida "Canção de Garoa" tentei me lembrar quando foi que eu havia contado que era a minha preferida. Ele sonolento me deu bom dia, eu dei risada e respondi com um "bom dia, flor do dia", jogou o travesseiro na minha cara, dei um sorriso e me lembrei mais uma vez que o seu irmão sempre comentava que ele acordava de mau humor. Nós dois sabíamos que estávamos de ressaca, me perguntei se ele tinha controle de tudo, e já tinha planejado como a noite passada terminaria ou se tinha ficado tão surpreso com o que acontecera como eu havia ficado. "Ei, você está com a minha camisa, que eu ia pedir de volta para colocar agora" eu ri internamente, ele mal sabia mas desde que peguei essa camisa meses atrás, não tinha intenção nenhuma de devolvê-la, respondi rindo "Acho que você vai ter que ficar com sua camisa suja e amarrotada de ontem a noite mesmo, se quiser posso te emprestar o ferro de passar roupa", levantou pegou a camisa amarrotada resmungou algo sobre passar roupa ser perda de tempo e foi direto para o banheiro. Voltei para cama, deitei de lado como sempre dormia e senti que minha cama já não tinha totalmente meu cheiro. Sorri feliz, mas cometei o grande erro de olhar para o meu mural de fotos na parede e me deparar com uma foto que eu não deveria ter visto, comecei a chorar descontroladamente, uma mistura de ódio, com culpa e dor me dominaram. Ele deve ter ouvido meus soluços do banheiro porque veio ao meu encontro, me dando um abraço apertado, fiquei me perguntando se não estava curioso para saber o porque eu estava assim, mas quando olhei para ele, seus olhos estavam fixos na mesma fotografia que eu tinha olhado minutos antes, e assim como eu, vi que sentia dor e tristeza no seu olhar. A sombra pairava sobre nós. Pedi desculpas, ele me pediu desculpas em seguida e percebemos que nenhum de nós deveria pedir desculpas. Ficamos em silêncio por um tempo e nossa conversa silenciosa me fez perceber que não deveríamos deixar que os fantasmas nos perseguissem. Levantei devagar fui até o mural e tirei a foto de lá, ele me olhou com um olhar de dúvida, eu disse que ia ficar tudo bem, senti um abraço apertado e choramos juntos. Estávamos acostumados a chorar, foi assim nos últimos 5 anos, mas agora eu gostava de pensar que mais riamos do que chorávamos desde que resolvemos ser um casal. "Seu cabelo está com um cheiro muito bom" respondendo eu comentei que tinha mudado de shampoo, enquanto as lágrimas de ambos secavam trocamos um beijo, comecei a lembrar da noite passada, na verdade comecei a lembrar desse primeiro mês que passamos juntos e me senti tão feliz, estava tão contente, contente como a muito tempo não me sentia. Abracei ele mais forte, ele me olhou nos olhos e falou "Eu te amo", fiquei surpresa, era a primeira vez que falava isso para mim, sorri e no meio do sorriso saiu um tímido "Eu também". Por um instante soube que ia ficar tudo bem e senti que um anjo sorria para gente .
* Escrito em 03 de janeiro de 2017
* Escrito em 03 de janeiro de 2017